quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Like That Shit Is So Old, It Was In the Bible


Há muitos anos atrás, eu costumava ser uma pessoa pontual. Na verdade, chegava sempre suficientemente adiantada para tomar um café e fumar um cigarro antes de a outra pessoa chegar. Mas a vida mudou. As pessoas já não usam relógios, usam os telemóveis para ver as horas e avisar que estão atrasadas. Já não se pode fumar enquanto se espera pelas pessoas, a não ser que se espere na rua/ à porta, o que é patético e me faz lembrar demasiadas cenas do Casablanca e depois dou por mim ou a murmurar «play it, Sam! Play "As Time Goes By"» ou a cantar A Marselhesa. Ser pontual, tal como ter as unhas sempre impecáveis, pode ser muito elegante, mas também sugere que se tem demasiado tempo livre, portanto está definitivamente passé.
Há tempos, fui ter com uns amigos (que também não chegaram a horas, apesar de serem super-elegantes) e cheguei atrasada. Tínhamos combinado no Amo-te Chiado, por alguma bizarra e esotérica razão. Entrei ofegante e disse: «Desculpem o atraso, é que fui ao sitio errado! Pensei que era para nos encontrarmos no Não És Tu, Sou Eu, Chiado».
É claro que as horas que se seguiram foram passadas a complementar este reportório, e inaugurámos os seguintes lounge-bars imaginários:
Não Estou Pronto para Uma Relação, Chiado
És a Pessoa Certa na Altura Errada, Chiado
Preciso de Espaço, Chiado
Ia Só Acabar por Te Magoar, Chiado
Conheci Outra Pessoa, Chiado
Sinto-me Sufocado, Chiado
Gosto Muito de Ti Mas Não Te Amo, Chiado
Queremos Coisas Diferentes da Vida, Chiado
Não Sou a Pessoa Certa para Ti, Chiado

Devo admitir que passei muitos anos da minha vida adulta, e parte da minha infância, a desempenhar o papel de As Outras Três Gajas para as Carrie Bradshaws à minha volta, com breves temporadas a desempenhar o papel principal de Carrie e a lacrimejar sobre amigos compreensivos. Contudo, esta tarde no Acho Que Devíamos Ser Amigos, Chiado foi um dos momentos em que estive mais perto de descobrir a verdade acerca dos relacionamentos. E a verdade é que: não estejam à espera de uma grande revelação que se reduza a um epigrama ou a uma anedota memorável, mas se se puser as coisas em perspectiva chega a ter piada.
Tive recentemente uma outra epifania acerca das complexidades do amor ao ler um artigo na New Yorker acerca da nova temporada (sim, é ainda mais patético do que esperar por alguém na rua, é LER acerca de telenovelas, sobretudo acerca de uma que se baseia quase exclusivamente naquilo que os protagonistas usam e na maneira como levantam o sobrolho a cada fala) da minha adorada Gossip Girl em


E esta foi a frase que fez com que tocassem a rebate os sinos da minha cabeça:

«Anyone can say I love you. People who can't say it are just being melodramatic.»

Uma das coisas que aprendemos quando ficamos crescidos (para além do facto de que sim, eles cortam MESMO a luz e a água se nos atrasarmos a pagar) é que as pessoas podem mentir sem ser necessariamente mentirosas. Podem ser desonestas, inconscientes, insensíveis, omissas, evasivas sem chegarem de facto a mentir. Com o tempo, descobrimos inúmeras maneiras de nos representarmos e até de nos vermos, e nenhuma delas é um retrato exacto. Esperar que alguém nos diga A Verdade num relacionamento, qualquer relacionamento, é como ir a um drag show e esperar não ouvir Whitney Houston: possível, mas pouco provável. É sempre mais divertido com um pouco de melodrama. É só não esquecer que é tudo a fingir.

Um comentário:

Marta Rema disse...

a verdade num relacionamento é sempre a fingir?... hum........ pois, não sei. eu acho que simplesmente as pessoas deixaram de acreditar no amor. numa verdade, um acontecimento, uma comunicação sem subterfúgios nem ouropéis. até fica ridículo dizer isto não é? não há tempo para o amor, apenas para relacionamentos. estamos sempre a correr, chegamos sempre atrasados... nunca tinha feito essa associação tão directa, mas é isso mesmo: ninguém espera, ninguém tem tempo.