Regra geral, odeio jornalistas. Com um ódio claro e penetrante como o sol de Inverno, forte e sólido como o lombo de um fox terrier, e inebriante como vodka finlandesa que foi passar umas férias à Rússia para descobrir as suas raízes (ou vice-versa). Odeio jornalistas de várias formas, feitios e media: os repórteres e os seus casacos de cameraman (não houve uma portuguesa que foi ao Iraque e deixou lá as cuecas quando foi raptada?); os comentadores com as suas opiniões absolutamente neutras e inconsequentes, e as suas referências obscuras; os pivots, que nem com um cartaz gigantesco à frente conseguem ler palavras com mais de duas sílabas (num dia bom); os jornalistas da imprensa que não sabem fazer copy. Excepção feita ao pato Donald e ao Peninha, cujas reportagens estelares ilustravam as páginas desse belíssimo ópusculo, A Patada, odeio jornalistas.
Tenho um amigo que via o telejornal de TVI como se fosse uma comédia. Ele tinha razão, visto assim era digno dos mais altos galardões. E tem de se reconhecer, cada país tem o Seinfeld que merece. Miguel Sousa Tavares ou Elaine Benes; Manuela Moura Guedes ou Cosmo Kramer. A partir do momento em que os termos «velhinhos» e «pobrezinhos» começaram a ser aceites em prime time, tudo se tornou possível.
Acho que não estou a ser demasiado violenta. Não é que eu deteste todos os jornalistas. Alguns dos meus melhores amigos são jornalistas, e tenho uma vizinha que tem um filho que é jornalista e ele ata os sapatos sem ajuda e tudo. Mas há uma coisa que me me dá apoplexias sucessivas (e isto tendo em conta que a apoplexia já nem é uma doença reconhecida pela comunidade médica): jornalistas sem rede. Quando estão à espera que um jogador saia de um balneário, que a família da vítima saia da morgue, que uma celebridade saia de um spa ou que um ministro saia de outro spa e começam a fazer tempo... bem, digamos que é nessas alturas que se percebe que a língua portuguesa tem mais muletas que uma centopeia com problemas do ouvido interno que está sempre a tropeçar.
A verdade é que sou menos tolerante (isto chama-se «eufemismo», meninos e meninas) com maus jornalistas porque admiro tanto os bons jornalistas. Muito do que hoje em dia se escreve de genial encontra-se nas páginas de revistas como a Esquire, a New York, a Slade ou a Vanity Fair. E enfim, este desabafo todo era só para mostrar este artigo (em duas partes):
Alguém que diga que ser gordo lhe permite enfrentar o frio com ursine insoupsiance ou que descreva a sensação (que o fumador tão bem conhece) de acordar de uma overdose de fumo como «ter o sabor de gaiola de papagaio na boca», domina, a meu ver, a arte do mot juste.
(Mas não posso deixar de salientar, neste desabafo, que é maravilhoso viver numa sociedade aberta, livre e democrática que permite os desabafos, e de reconhecer o papel que desempenham jornalistas corajosos e dedicados para que todas as sociedades assim o sejam.)