terça-feira, 20 de novembro de 2007

Gotas de Chuva em Rosas e Bigodes em Gatinhos


Embalagens de papel vegetal e luvas de lã quentinhas, Invernos branco e prata que se transformam em Primavera, essas são algumas das minhas coisas favoritas.

Estas são outras:

1 - Jimmy Wales, um dos fundadores/ criadores da Wikipedia e do conceito de Wiki em geral. Não vou fingir que sou letrada no conceito de Wiki ou noutros conceitos relacionados com os admiráveis mundos novos da tecnologia em geral. Mal sei tirar fotografias com o telemóvel, por amor da santa! Mas respeito e admiro pessoas que sejam capazes de fazer uma batelada de dinheiro, e o Sr. Wales é uma delas. A Wikipedia fez mais pela democratização do saber desde... digamos, desde Platão ou a Oprah. De certa forma, é uma metáfora da própria democracia: amplamente usada e abusada, completamente aberta (ao ponto de ser considerada demasiado acessível), muito falível mais ainda a melhor enciclopédia com excepção de todas as outras (que são a pagantes). Agora que penso nisso, também é uma boa metáfora de um dos meus bares preferidos do Bairro Alto. Mas, como num artigo da Wikipedia, estou a divagar e a esquecer-me do essencial. O Sr. Jimmy Wales é uma das minhas coisas favoritas porque disse hoje, numa entrevista ao New York Times:

http://www.nytimes.com/2007/11/18/magazine/18wwln-domains-t.html?adxnnl=1&ref=magazine&adxnnlx=1195427645-Up/Uwsk5rfAdv5JjCadWIQ

duas coisas adoráveis: que ia comprar um Mini Cooper (é quase um fashion statement, e não necessariamente dos bons, nos EUA) e que colecciona livros (toma lá, Kindle da Amazon e e-reader da Sony!). Mas não só colecciona livros, como também cola pequenas tiras na lombada com os números de catalogação-na-origem da Library of Congress e organiza-os asssim - e ainda tem a frontalidade de classificar isso como «ubelievably geeky».
Mas, mas, mas... o mais giro ainda é que não tem registo informático da colecção!
O fundador da Wikipedia tem uma mini-Library-of-Congress em casa mas não se dá ao trabalho de fazer um registo informático deste processo tão «unbelievably geeky»!
Há quem diga que um homem se conhece pelos sapatos que calça, pela gravata que usa, pelo scotch que bebe. Eu acho que uma pessoa se conhece por estas pequenas contradições.

2 -Outra das minhas coisas favoritas chama-se Fred Feinsilber. Conheci-o num vôo de Frankfurt; eu ia em turística, ele vinha retratado num artigo do International Herald Tribune:

http://www.iht.com/articles/2006/10/06/features/melik7.php

A infância dele parece um conto de fadas em que a fada-madrinha má e invejosa ganhou às outras. Nasceu em Bucareste em 1940, filho de judeus russos. O pai foi recrutado à força pelo exército soviético e a família nunca mais o viu. Ele e a mãe escaparam à justa de uma deportação para a Sibéria e acabaram por se instalar em França (via Israel e outra vez Roménia). Aqui a fada-madrinha ressentida parece ter acalmado: o rapaz estudou Engenharia Química, desenvolveu uma coisa/invenção daquelas que os engenheiros desenvolvem e fundou uma empresa que depois teve a sorte de ser comprada pela Dow Chemicals. O rapaz tinha 52 anos e uma data de malas de mão recehadas de notas, como nos filmes.
Talvez por influência da fada-madrinha de mal com a vida, o rapaz tinha um fraco por livros em geral e Camus em particular. Como toda a gente sabe, se Sísifo fosse vivo hoje não estaria a empurrar uma rocha montanha acima, montanha abaixo, mas a fazer uma coisa ainda mais trabalhosa: a coleccionar livros.
Começa então o rapaz a coleccionar edições raríssimas de manifestos de artistas, livros de poemas ilustrados e outras curiosidades elegantes e bem conseguidas. Um manifesto do expressionismo alemão com gravuras de Kandinsky aqui, um livro de poemas de Eluard com desenhos de Picasso ali. Aberto o apetite, vai apanhando um ensaio de Geoffroy com litografias de Toulouse-Lautrec, uma sátira do séc. XV com gravuras de Dürer, uma edição original dos Quatro Livros de Arquitectura de Andrea Palladio.
Composta a colecção, o que é que o rapaz decide fazer? Bom, se foram ao link, já sabem: foi leiloada na Sotheby's de Paris.
E porque é que alguém faria isso?
Diz o rapaz: «Quando se colecciona, começamos por comprar aquilo que nos fascina, Depois aprendemos a subir ao nível do objecto. Quando termina o processo de descoberta, coleccionar torna-se um jogo de poder. É altura de seguir em frente.»
Se houvesse epitáfios em vida, era isto que queria que escrevessem no meu.
Aqui, «coleccionar» é um eufemismo para «viver». Porque a vida pouco mais é do que uma longa colecção de momentos e coisas.

E estas são duas da minhas coisas favoritas, de que me lembro quando o cão morde, a abelha pica, ou me sinto triste.

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