terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Os Boulevards da Amargura




Nos últimos meses, tem-se falado muito acerca da aglomeração das editoras portuguesas em grandes grupos: a Explorer I, a Leya, a Bertlesmann, a Citroen... Se bem que, na sua maior parte, estas conversas fossem alternativas ao inevitável tema da proibição de fumar, revelaram uma coisa até então insuspeita: que as editoras dão dinheiro, ergo, que os livros vendem, ergo, que os portugueses lêem. Ou isso ou que descobriram na literatura uma fonte barata de aquecimento, comida ou vestuário. E, se bem que eu gostasse mais de usar o último livro de (inserir aqui o nome do vosso autor mais detestado) do que de o ler, acho que é verdade que os portugueses lêem cada vez mais. O que gera uns estranhos bedfellows: editores e homens de negócios. O poster boy deles tem sido o Miguel Paes do Amaral, esse grande empresário, o homem que disse certa vez ser a primeira pessoa da família em 400 anos a precisar de trabalhar e que, com o seu charme de Dr. House-meets-Richard-Branson, agora detém o maior grupo editorial do país (a não ser que venda tudo à Citroen).


Tenho verificado muitas reacções de tristeza a estas compras e vendas. Quase ninguém gosta de grandes grupos (é a nossa costela anti-sistema ou talvez anti-napoleónica) e quase ninguém gosta de trabalhar em grandes empresas. Ao mesmo tempo, muitas pessoas parecem chocadas com o facto de um millieu tão artístico, quase de artesãos, como o do livro, estar aparentemente a ceder ao encanto do capital. Creio que as pessoas imaginam os editores como cavalheiros vestidos de tweed, que vão para os copos com escritores mas não bebem muito para depois poderem levar o génio embriagado para casa, que passam os dias em escritórios forrados de livros, a fumar português suave e a suspirar quando chegam as contas ou os relatórios de vendas. E alguns são assim. Mas também é verdade que os editores são os tipos que tiveram a brilhante ideia de ganhar a vida a vender literatura; só acontece que nem sempre o fazem muito bem.


No contexto da comercialização da literatura, e numa cultura centrada no consumidor, sugiro algumas alterações aos títulos dos seguintes clássicos das letras, cujas vendas nem chegam aos pés de coisas como O Segredo ou A Estrela de Joana.




Romeu e Julieta passaria a chamar-se Atracção Fatal;


Madame Bovary - O Pecado Mora ao Lado;


Os Lusíadas - Mar Adentro;


Guerra e Paz - Com Jeito Vai... na Rússia;


Orlando - Quando Ele Era Ela;


A Dama das Camélias - Call Girl;


A Sibila - Que Bem Que Se Está no Campo.




Assim, quando o incauto leitor se apercebesse de que não estava, de facto, a ler um thriller pejado de acção e mulheres de biquini, já estaria viciado em boa literatura. E assim podíamos todos acabar numa sala forrada a livros, a fumar português suave. Ganhavamos nós, ganhavam os editores, ganhava o Paes do Amaral e ganhava a Citroen.






P.s. - a Citroen não anda a comprar editoras, que eu saiba, mas queria ver se conseguia espalhar o boato para valorizar o meu pequeno C1.

Um comentário:

Berta Cem Mil disse...

Tens um humor fabuloso, dear... Mas faço um reparo ao título alternativo de Os Lusíadas: Mar Adentro remete para o Javier Bardem paralisado, acho que não venderia muito...
Que tal Titanic 2 (mete água com fartura e também não tem final feliz...)?